das expectativas frustradas



“And back at the wilshire, Pedro sits there dreaming
He’s found a book on magic in a garbage can
He looks at the pictures and stares at the cracked ceiling
‘At the count of 3’, he says, ‘I hope I can disappear’”




Não espere nada, nunca, de ninguém. Raramente alguém pode suprir suas necessidades. Aliás, porque diabos alguém deveria supri-las? Quem inventou essa história?

Tudo é interesse.

Eu só vou olhar pra você, se você tiver algo em que eu me interesse, algo que eu possa, literalmente, usar. Seja o teu rosto lindo, tua mente louca (que me encanta), teu físico na medida certa, aquilo que você me fala, o que você me mostra, me ensina, o prazer que você pode me proporcionar, físico ou não. Você tem que fazer meu mundo se ampliar em algumas dimensões pra me despertar interesse.

Ficou chocado? Vai me dizer que você não usa ninguém...? Ah, tá. O pai não usa o filho, para fazer dele um pequeno alterego, pra se perpetuar? O filho não usa os pais para sobreviver? Os amantes se usam mutuamente, seja arrancando prazer, seja desenhando no outro a imagem de um ideal perdido há muito. Chefes e subordinados. Deuses e fiéis. Amigos se usam para conselhos, conversas, desabafos, antídotos contra a solidão. Eu e você, afinal você só vai ler este texto se ele te despertar algum interesse, e eu, eu só quero te mostrar o quanto eu sou ‘especial’...

No fundo todos sabem disso, mas é feio admitir. Sim, sim. Por que vivemos numa sociedade cristã, onde devemos dar sem esperar receber nada em troca. Na teoria isso é bem bonito. Nobre, até. Mas pense bem, se levássemos isso numa boa, se aceitássemos que não é tão ruim ser usado, afinal usamos também, veríamos que, no final das contas, vamos ganhar muito mais e perder menos tempo.

Perder menos tempo esperando ligações que não virão, porque, meu caro, foi só uma noite de diversão. Aceita e cala. Perder menos tempo fuçando orkut’s, myspace’s, facebook’s, entre outros, na busca inútil e frustrante de descobrir se a pessoa te leva tão à sério quanto você à ela.

E vai ganhar muito mais. A leveza de espírito ao se saber livre, dona do próprio prazer. A tranqüilidade de saber ter esse prazer quando quiser. Vai ganhar algo que não tem preço: L-I-B-E-R-D-A-D-E.


do alimento do tempo



Vivemos acontecimentos únicos, inesquecíveis, deliciosos.
A primeira vez que pedalei sozinha, crédula de que meu pai ainda segurava a garupa, confiante de que ele não me deixaria cair. Uma leve desequilibrada me mostra que não há mais mãos fortes, calejadas, me sustentando, mas ao invés de medo o que senti foi um orgulho avassalador por saber que eu já estava pronta pra seguir só. Saí pedalando feita louca pelo calçamento da pousada Ponta Porã, em Camocim, o mundo à minha frente.
O suspiro de alívio quando, aos 15, decidi sair de casa. O peito baixando ao deixar sair toda a angústia que o “será que vou conseguir” causava.
As conversas loucas com amigos. Dançar em cima de mesa do bar mais chic da cidade com o melhor amigo.
Olhares furtivos, prelúdio de grandes paixões. Os mesmos olhares furtivos, dessa vez quando a paixão acabava...
Perdemos-nos nessas recordações, o nosso semblante se enlevando a medida que as lembranças vêm. Então nos damos conta que falta algo... Aquilo não foi tudo o que vivi, o que senti! O enlevo se esvai. Vem a frustração do não lembrar uma voz, uma imagem, uma sensação. Passagens de vida devoradas pelo tempo.
Passamos a ver o tempo com T maiúsculo, um ser que se alimenta dos nossos sonhos, nossas experiências mais belas. Quanto mais vivemos mais ele se alimenta, mais forte fica, mais rápido ele passa por nós na ânsia de nos fazer viver mais e mais coisas, mais sabores diferentes, pedaços de vida para ele se deliciar.
Finalmente o que nos resta é nada. Não nos lembramos de nada, estamos velhos, famintos do que nos foi tirado, tentando arduamente recordar dessa ou daquela experiência. As pessoas perdem a paciência, os netos desviam-se do quarto que nos enclausura.
O tempo, este não está mais interessado em nós: árvores murchas, outrora rica em alimentos, hoje ele se desvia de nós, desliza das mãos lentamente, como se nos castigasse por não termos mais o que ofertar.
E como se esta meia-vida não fosse punição o suficiente, ele não nos leva tudo, ah não!, ele nos deixa fiapos de lembranças para sabermos que em algum momento fizemos corações pararem de bater com um único olhar, respirações falharem com um só toque, mas não lembramos do essencial: dos olhos amados nos olhando de volta com adoração, do suspiro que rompia os lábios quando a carícia chegava ao local tão esperado. Não só não lembramos plenamente dessas delicias, mas temos a certeza que não poderemos vivê-la novamente, pois o nosso tempo, finalmente, acabou.
Roza, 14 de Janeiro de 2010

como ser um grande escritor

você tem mais é que comer muitas mulheres
mulheres bonitas
e escrever uns poemas de amor decentes.
não se preocupe com a idade
e/ou novos talentos.
apenas beba mais cerveja
mais e mais cerveja
e vá às corridas ao menos uma vez por
semana
e ganhe
se possível.
aprender a ganhar é difícil -
qualquer porcão pode ser um bom perdedor.
e não se esqueça de Brahms
e de Bach e de sua
birita.
não faça muito exercício.
durma até o meio dia.
evite cartões de crédito
ou pagar qualquer coisa no
dia.
lembre-se que não existe um cu
nesse mundo que vale mais que $50
(em 1977)
e se você tiver a capacidade de amar
primeiro ame a si mesmo
mas sempre tenha em mente a possibilidade de
derrota total
ainda que a razão dessa derrota
pareça certa ou errada -
um gostinho de morte cedo não é necessariamente
uma coisa ruim.
fique longe de igrejas e bares e museus,
como a aranha seja
paciente -
o tempo é a cruz de todo mundo,
mais
solidão
derrota
traição
toda essa sujeira.
fique com a cerveja.
cerveja é o sangue contínuo.
um amor contínuo.
pegue uma boa máquina de escrever
e enquanto os passos vêm e vão
além da sua janela
bata nela
bata nela com força
como se fosse uma luta de pesos pesados
faça como o touro em sua primeira investida
e lembre-se dos velhões
que lutaram tão bem:
Hemingway, Céline, Dostoiévski, Hamsun.
se você acha que eles não enlouqueceram
em quartos minúsculos
assim como você faz agora

sem mulheres
sem comida
sem esperança
você então não está no ponto.
beba mais cerveja.
há tempo.
e se não houver
está tudo bem
também.
(Charles Bukowski, tradução de Fernando Koproski)

beijo



O nosso beijo não toca na beleza da minha ou tua boca, mas no íntimo da nossa alma, no âmago do nosso ser: nossa amizade.
Amizade esta que se tornou um alimento para minha felicidade que é quase constante quando estou contigo, desfrutando do nosso dolce far niente.
Vento no rosto, fumaça gostosa avermelhando nossos olhos, pés sujos de areia, risadas espontâneas rompendo os nossos lábios (selados para deixar o "ar" lá dentro).
Eu te amo e nunca antes havia encontrado pessoa tão semelhante e tão diferente de mim. 
Desejos contraditórios me partem ao meio: proteger-te desse mundo ou te ajudar a viver as mais loucas aventuras para que você veja tanto quanto eu já vi?
Só de uma coisa eu tenho a resposta: eu vou estar sempre ao teu lado. 
Triste, feliz, chata, linda, feia, gorda, magra, rica, pobre, não importa. Seremos sempre duas partes que se tornam uma, que completam a sentença uma da outra, que faz a outra prestar atenção no que é importante quando na realidade estamos muito distraídas com o vento que passa e acaricia e traz odores...
Viveremos nossas vidas, tentaremos realizar o que sonhamos, e faremos de tudo para não permitir que o tempo nos separe.
Estaremos sempre juntas: seja na beira do rio olhando-o correr, seja sendo levadas pela correnteza.

Roza